(texto da Lia em 29/03/2008)
Explicando o título do post: existe uma música da Brigitte Bardot intitulada 'Je danse, donc je suis'.
'Eu danço, então eu sou'? Ou 'Eu danço, então eu sigo'? Trocadilhozinho bacana, esse.
Pois bem: estou começando na dança de salão. Verdade que com uma dedicação pouco vista por aí, mas estou começando ainda. Meu repertório de passos é bem limitado, e ainda me falta aquela coisa de corpo, de saber fazer bom uso dos quadris, da perna esticada no bolero, de fazer o que faço, mas com a postura adequada à modalidade. Ainda tenho muito o que aprender - e, como quero aprender, nada melhor do que sair pra dançar, e não me contentar apenas com as aulas. A gente vicia em dançar com nossos colegas de turma e professores e, na pista, na hora de dançar com um cavalheiro de outra escola, outra formação e outro background, não rola um entrosamento.
Quando você está começando, é difícil mesmo conciliar passos com entender a música, com entender o que o cavalheiro te diz, com manter o tempo, com se manter no tempo do cavalheiro, e ainda tem que lembrar de postura e... ora, dama. Chute o balde. Dance para se divertir.
Malandra que sou, saí pra dançar com um amigo que conheço há quase vinte anos. Se ainda tenho dificuldades pra me entrosar com os cavalheiros por aí, com esse a dança fluiu tão bem quanto o papo, que se estendeu até altas horas da madrugada, mais pela intimidade que já existia do que pela minha dança espetacular, haha. Obviamente, o fato do amigo ter mais de vinte anos de dança a dois dentro de apenas trinta e um de idade, e da escola dele ter sido a pista de dança, e não uma ou outra academia que ensina uma ou outra técnica (e da minha escola de teoria musical ter sido a mesma que a dele!), tudo isso ajuda. Mas ele podia ser um desses dançarinos excelentes que só dançam com gente do mesmo nível, pra poder se exibir. Podia ficar entediado por não conseguir fazer comigo metade do que faria com alguém mais experiente. Mas ele também só queria se divertir. Ponto pra gente.
A noite valeu por umas dez aulas de dança - até porque, a cada nova música, a cada novo par, você aprende alguma coisa: é outro corpo, é outro estilo, é outro tempo. Você tem uns três minutos e meio - tempo de uma música - para entender como é a dinâmica daquela pessoa e, quem sabe, se entrosar. Faz parte da cultura do salão você dançar com várias pessoas - mas nesse dia, e nesse momento do meu aprendizado, foi muito importante acontecer o que aconteceu: passar a noite inteira dançando com uma pessoa só. Houve um entrosamento que eu nunca tinha experimentado - a primeira música foi um desastre, na última eu já estava dançando salsa mesmo com apenas duas aulas de salsa no currículo. E, ainda assim, não lembro de ter feito nada que eu tenha aprendido em aula. Como assim...?
* * *
Coisas que aprendi na última noite, comigo ou observando os outros:
- Se você se preocupa demais, você não se diverte.
- Se você se diverte, você só fica sentada se quiser.
- Cavalheiro bom não é o que dança melhor, mas o que sabe se divertir contigo. Presumindo que você seja uma dama que se diverte, claro.
- Afetação na pista de dança é brega.
- Se exibir na pista de dança é brega.
- Você pode ter sido grunge durante sua fase de formação de caráter (também conhecida como adolescência), pode ter passado quase um dia inteiro num ônibus pra ver sua banda de rock preferida (e mais um dia inteiro de volta), pode ter até uma tatuagem dessa banda. Ainda ontem você cantou todas as músicas do Matanza e vibrou com os Autoramas tocando 'Seek and Destroy'. Ainda assim, admita: dançar forró é bom demais, dançar forró com um par que pode ser classificado como 'o maior gostoso' é melhor ainda.
- Já tinha ouvido falar, mas pude comprovar: salsa e swing americano são parentes. MESMO. Parentes distantes criados em países diferentes, mas parentes.
- Não sei exatamente o que fiz, mas o fato é que fiz, mesmo com apenas duas aulas de salsa na vida. Enquanto ele (profissional da área) parece saber muito bem o que me fez fazer, eu só consigo conjecturar: tenho quase certeza de que, enfim, me entreguei e segui. E aí, filha, quando você quer, você fala até japonês.
- Óbvio que conduzir e seguir não é uma relação engessada. Dança não é apenas um que guia e outro que se deixa levar: é uma troca, é a dois. É pergunta e resposta o tempo inteiro. E mesmo que você não saiba a resposta correta, o que você não pode fazer jamais é não responder.
- Aí você perde o tempo, troca o passo, tropeça no próprio pé e teu par está lá, se divertindo tentando te acompanhar (nota: o guia é ele. ele está tentando acompanhar tua falta de jeito), do mesmo jeito que você está se divertindo tentando acompanhar um dos melhores dançarinos da cidade. E essa é a graça.
- As pessoas estão olhando, mas você não faz questão de fazer bonito pra elas, e sim de fazer gostoso com quem está na tua frente, te dando a maior atenção.
* * *
Tudo isso parece óbvio demais, ou pode parecer que não é nada demais, mas é curioso sentir essa mudança de estágio, conseguir perceber coisas que até então eram imperceptíveis - e o que rolou depois de bônus foram horas e horas de análise, dicas e conversas para ajudar a esclarecer pontos e fortalecer (ou quebrar) algumas posições e relações que tenho com dança.
Ficou a lição - que eu já sabia! - não apenas da importância da prática, como da importância de transformar toda e qualquer situação de dança numa oportunidade de aprendizado.
E o aprendizado, esse fanfarrão, com ou sem dança envolvida, é muito mais eficaz quando a gente se diverte ao mesmo tempo. E taí uma das melhores coisas da dança de salão...
Um comentário:
Meninas, Lia e Adriana, adorei o blog de vocês, o texto, o layout, vocês estão de parabéns!
E agradeço também terem colocado a indicação do link para o Jornal Falando de Dança.
Semana que vem farei a chamada do workshop nas dicas da semana, ok?
Beijinhos e depois vamos conversar sobre publicar alguns desses textos no Jornal, pois muita gente não tem tempo de navegar ou sequer mexe em computador.
Leonor Costa
www.jornalfalandodedanca.com.br
Postar um comentário